O ADIAMENTO DA RODADA DE DOHA
Renato Augusto Pontes Cunha*

Em novembro de 2001, houve o lançamento da rodada de DOHA da OMC, capital do pequeno Catar, um Emirado da Península Arábica, situado no Golfo Pérsico, palco que sucede a grande tentativa de liberalização do comércio internacional, ocorrida entre 1986 e 1993, na chamada rodada do Uruguai, ocasião em que os Países ricos conseguiram impor fortes protecionismos, desfavoráveis aos Países emergentes, onde se inclui o Brasil e que atualmente integra o G-20, bloco que atua para flexibilizar barreiras protecionistas que travam o comércio internacional, onde, nosso País tenta vencer, um verdadeiro diálogo de surdos, alavancando mais equilíbrio no tripé; eliminação de subsídios, redução de tarifas (acesso a mercados) e diminuição dos apoios a mercados internos, distorcivos para a competição global. O fato é que o Brasil concentrou os ovos numa única cesta, ao apostar fortemente em DOHA. O Itamarati foi leniente com nossas abordagens nos acordos bilaterais, deixando de lado até a própria ALCA, acreditando na OMC e num utópico livre mercado internacional que agora sofre um grave travamento em DOHA com suspensão de negociações por tempo indeterminado ou até que os Países ricos venham a valorizar e de fato precisar, fortalecer seus estoques, por exemplo, com importações de alimentos, época em que o Brasil poderá vir a deslanchar, no cenário internacional, se fazendo mais respeitado como fornecedor contínuo. Por outro lado, não podemos abrir nosso mercado doméstico, manufaturado, em troca de acessos tímidos tanto para o nosso agronegócio, bem como para maiores valores agregados. É um jogo de paciência que envolve bilhões de dólares e às vezes é melhor a ausência de acordos do que a amarração a um mau acordo como vem ocorrendo com os Países menos desenvolvidos desde o pós-guerra em 1944.         
O sistema multilateral de comércio deve ser perseguido como um caminho seguro para o “renascimento do chamado terceiro mundo” em um contexto mais igualitário de trocas comerciais internacionais. No entanto, os Países ricos não fazem concessões sem pressões correlatas por benefícios tarifários em abertura e acesso a mercados. A lógica de todo o processo pode ser compreendida, cronologicamente, desde o início da tentativa de construção de uma nova ordem econômico-liberal a partir do acordo de Bretton Woods em 1944 quando se criaram os pilares; ONU, FMI e Banco Mundial ou BIRD e por conseqüência a OIC (Organização Internacional do Comércio); embrião da OMC.
A OIC funcionou inicialmente de 1947 até 1995 como GATT ou Acordo Geral sobre tarifas e comércio com atuação mais branda do que uma organização mundial de comércio. O GATT envolveu 8 rodadas de negociações tarifárias, desde a Suíça em 1947, passando por França (1949), Reino Unido (1950-51), Genebra em 1956, 1960-62 e 1964-67, Japão (1974-79) e Punta Del Este no Uruguai que em 1986-93 estabeleceu o início da OMC - Organização Mundial do Comércio. Em janeiro de 2002 a OMC já era composta por 144 Países. A entrada da China em 2001 e os processos de adesão da Rússia e de outros Países da Europa Oriental demonstram a atual amplitude da OMC, notadamente quanto ao complexo caráter geográfico de seus membros. De outro lado, com a frustração das atuais negociações de DOHA, o caminho brasileiro mais racional será a busca por uma aceleração em acordos bilaterais para, a partir daí, evoluirmos provavelmente, para um possível multilateralismo de negociações.
No entanto, todavia, nem tudo foi desastroso, merecendo registro positivo a entrada da China na OMC a partir de DOHA, e, talvez a suspensão da rodada seja um caminho para uma hipotética volta e retomada das negociações, com uma geografia comercial nova que fortaleça o G-20, coalizão onde estamos inseridos, com forte foco na agricultura e constando de cinco Países da África (Egito, Nigéria, África do Sul, Tanzânia e Zimbábue), seis da Ásia (China, Índia, Indonésia, Paquistão, Filipinas e Tailândia) e nove da América Latina (Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, Cuba, México, Paraguai, Uruguai e Venezuela), todos com planos audaciosos de abertura econômica internacional, com vistas à consolidação de novos, auspiciosos fluxos de comércio em agricultura, indústria e serviços.

* Presidente do Sindicato da Indústria do Açúcar e do Álcool no Estado de Pernambuco - SINDAÇÚCAR
(rcunha@sindacucar.com.br)