Abastecimento de Álcool
Renato A. Pontes Cunha
Em 6 de fevereiro passado, por iniciativa do Ministro da Agricultura, fomos convidados, juntamente com lideranças do setor sucroalcooleiro, a participar de uma reunião com o Presidente Luis Inácio Lula da Silva. O objetivo daquele encontro foi o de analisar a questão dos preços do álcool ao consumidor. Na ocasião, confirmamos o compromisso assumido por Eduardo Carvalho, representante da UNICA-SP, de aumentar a produção de álcool na próxima safra. Também foi acordado que o preço do álcool às distribuidoras seria “engessado” em até 60% do preço da gasolina nas bombas. Além disso, a moagem da safra 2003/04 seria antecipada para março/abril, o que, aliás, já vem ocorrendo.
No nosso segmento têm sido constatadas oscilações no binômio volume x preço do álcool, em razão, sobretudo, da ausência de regulamentação setorial. Essa situação não data de hoje: vem ocorrendo desde o início do primeiro mandato do governo passado. Apesar disso, houve um crescimento de mais de 1 bilhão de litros de álcool na safra 2002/03, ou seja, um incremento de 10% da produção.
Nos últimos tempos, o Nordeste tem colaborado decisivamente para o suprimento de etanol ao Centro/Sul do país: em 2000/2001 transferiu, sem necessidade de volta, mais de 280 milhões de litros, via leilões eletrônicos públicos, e cerca de 80 milhões de litros foram transferidos para aquela região, na atual entressafra paulista (desta feita com a necessidade de volta, a partir de junho próximo).
O produtor de álcool não é intermediário e, portanto, não é responsável pelo preço final ao consumidor. O preço final do álcool é da responsabilidade das cinco irmãs (Shell, BR, Ipiranga, Esso e Texaco) e, em menor escala, das chamadas “emergentes”.
Nesse cenário doméstico de oferta limitada - em razão dos preços tímidos do álcool ao produtor e, em menor escala, da atual conjuntura, caracterizada pela explosão do consumo doméstico, o ambiente do álcool tem sido marcado pela falta de interesse do governo federal em relação à questão das energias renováveis. Um exemplo disso é que nunca aceitou discutir preço interno mínimo para o álcool, nem as distribuidoras foram compelidas a operar em faixas mínimas de rentabilidade. Assim, tornou-se quase impossível ordenar o suprimento brasileiro do etanol em bases cartesianas. E, em vez de se privilegiar o produtor e o consumidor, o intermediário acabou levando em muito a melhor.
Hoje, o que é grave não é a falta do álcool, já que é inexistente, mas, a total ausência de um planejamento prático, operacional. Por exemplo, venda e compra do produto através de leilões, com recursos gerados via CIDE (formada com o álcool). Mecanismos dessa natureza poderiam ser implementados a partir de agora, no início da safra do Centro/Sul. Também não é difícil formar estoques de álcool equivalentes a um mês de consumo. O governo teria apenas que fazer face aos argumentos obstaculadores utilizados pela Petrobrás (dificuldades logísticas, cabotagem, fretes, armazenagem, etc.) que preferiu, na gestão passada, recorrer ao álcool “mico” dos Estados Unidos, importando-o sem nenhuma contrapartida em exportação.
Gestão de crise é fundamental nessa fase e temos competência para exercitá-la. De nossa parte, estamos, inclusive, investindo com nossos próprios recursos em infra-estruturas públicas, a despeito da ausência de normativos governamentais. O atual governo, por seu lado, tem demonstrado sua vontade de acertar e não desconhece que o agronegócio da cana gera, no Brasil, mais de um milhão de empregos diretos, dos quais 300 mil apenas no Nordeste. Ao que tudo indica, não pretende ficar só na retórica.
Não vai haver falta de álcool. Vamos começar a produzi-lo, mesmo que onerosamente, antes do tempo previsto para o início da safra normal. Acreditamos que o consumidor e o Governo atual são merecedores desse esforço, já que o atual presidente sempre defendeu o álcool, e isso mais que o credencia a ser atendido. Por outro lado, estamos convictos de que as distribuidoras serão também convocadas ao Planalto e solicitadas a flexibilizar suas margens de vendas. Afinal, ao contrário do setor sucroalcooleiro, a maioria delas comercializa produtos de altos custos para o meio ambiente, além de gerar pouquíssimos empregos.
É importante agora que o Governo comece a planejar de forma prática, sem retórica, olhando o potencial agrícola brasileiro em todos os seus diferenciais, potencializando-o em benefício da sociedade. Esse é o caminho que vai nos levar à liderança mundial no domínio da agricultura e, particularmente, da agricultura energética. Não estamos longe disso. Afinal, o Proálcool está rejuvenescendo e o automóvel flexível álcool/gasolina é o moderno instrumento tecnológico que o consumidor usará para exercer a sua livre e melhor opção.
* Presidente do Sindicato da Indústria do Açúcar e do Álcool no Estado de Pernambuco - SINDAÇÚCAR