Mercado Comercial do Hemisfério Sul
 
Na semana passada de 10 a 14 do corrente, os Estados Unidos apresentaram, em Washington, a sua oferta de acesso à futura área de livre comércio das Américas (Free Trade Américas Agreement), como parte do estabelecimento de um mercado “Duty Free” (sem tarifas de importação) nas Américas, no intuito maior de tornar as vidas americanas mais baratas. O anúncio envolve bens de consumo e produtos industrializados, agricultura, serviços, investimentos e compras governamentais. A oferta isentará 65% das importações dos EUA, imediatamente após a ALCA entrar em vigor (2005) e, segundo está previsto, o saldo (35%) será eliminado gradualmente até 2015.
Os produtos têxteis e de vestuário, a serem importados pelos EUA, ficariam isentos de impostos de importação em cinco anos, desde que haja igual estratégia por parte dos países exportadores (mão dupla).
A partir do início da ALCA (2005), também sob condições de reciprocidade, seriam eliminadas taxações sobre produtos químicos, equipamentos para construção civil e mineração, equipamentos elétricos, produtos da área de energia, produtos ambientais, tecnologia da informação, equipamentos médicos, tecido não tecido (falso tecido), produtos de papel, aço e madeira.
A agricultura, principalmente por ser grande empregadora, está protegida, e, aproximadamente só 56% das importações agrícolas do hemisfério ficariam isentas de impostos assim que a ALCA for iniciada oficialmente. Outras tarifas agrícolas teriam redução gradual em 5, 10 ou mais anos, e seriam ajustadas para cada país. Esses são os números tangíveis. Porém, as situações intangíveis, tais como dumping, subsídios e exageros nos controles sanitários, não foram ainda disciplinadas.
Pelos estudos do governo dos EUA, a ALCA trará uma vida mais barata para os consumidores daquele país, ensejando um aumento de renda de US$ 814 por ano para famílias de trabalhadores norte-americanos.
O fato é que essa primeira oferta, embora “básica”, conforme opinam os especialistas, é um início para a consolidação da fase “avançada”. Neste início, a oferta foi mais adequada aos países do Caribe e América Central, menos competitivos do que os do Mercosul, entre os quais estamos incluídos. Na fase inicial, as velocidades de isenção ficaram assim: os países caribenhos já partem com 91% de isenção, os da América Central com 66%, os países andinos com 61%, e nós, do Mercosul, com 58%, o que leva a média para 65%. Em novembro próximo, em Miami, haverá uma reunião “summit” (de cúpula), ou a cimeira da ALCA, como dizem os portugueses, onde os aspectos não tarifários deverão ter tratamento mais pormenorizado.
O açúcar, como era esperado, não constou dos itens para os quais está prevista a liberação inicial de 65%, por se tratar de produto “sensível”, um conceito ligado à geração de empregos. No entanto, no que se refere à agricultura, o Brasil é um gigante que impõe respeito ao universo dos competidores. Individualmente, com uma produção global de mais de 100.000.000 de toneladas de grãos, estamos volumétricamente inferiores, na atualidade, apenas aos Estados Unidos e à China. No entanto, como esses dois países já atingiram o limite do crescimento agrícola, o Brasil passa a ser a mais viável alternativa como produtor de alimentos do planeta. Assim, se implementarmos as nossas reformas internas (previdenciária, fiscal e trabalhista), nos apresentaremos logo, logo, ao mundo, como um país seguro para investimentos estruturais que objetivem retorno ao abastecimento alimentar sustentado do planeta. Então, os eventuais subsídios externos a outras agriculturas não mais representarão uma ameaça intransponível à nossa competitividade. Estaremos aptos ao enfrentamento de quaisquer adversidades no âmbito das exportações de commodities.
Por outro lado, nosso país é muito pouco divulgado no exterior. Por isso, vamos levar ao BNDES nossa preocupação em torno da importância de o banco fomentar empréstimos a empresas brasileiras que tencionem aplicar no exterior, com vistas à alavancagem de negócios, recursos para implantação de departamentos comerciais. Afinal, prospecção e montagem de negócios devem ser perseguidas não só através de vendas isoladas, mas, sobretudo, com um seguro acompanhamento pós-venda. A ALCA, um mercado hemisférico em 34 países, envolvendo cerca de 800 milhões de consumidores, não pode ser subestimado, nem relegado a segundo plano, mesmo se suas condições iniciais ainda não nos parecem favoráveis. É através da ALCA, como também do comércio internacional, que pode surgir a oportunidade de uma migração de capitais não voláteis destinados a investimentos que podem promover a criação continuada de emprego.
Renato A . Pontes Cunha
Presidente do Sindicato da Indústria do Açúcar e do Álcool no Estado de Pernambuco